sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Augusto e Francisco

Neste pequeno extracto de vídeo está o Augusto, durante largos anos porteiro na sede da Rua Augusta e depois do edifício Caracol, onde estava o contencioso do Banco Nacional Ultramarino e vemos também o Francisco, que foi durante muitos anos contínuo no contencioso tanto no Caracol, como depois na 5 de Outubro.





Sempre tive um carinho especial pelo Francisco. Eu chamava-lhe o Xico Fininho (por ser gordo, claro) e ele dizia que quando fosse presidente da República de S. Tomé me havia de chamar para ministro. Algumas vezes pensei que estava a falar a sério, tal a convicção com que o dizia. Contava-me os problemas familiares e ainda agora penso que a sua luta não terá sido fácil. Não sei o que será feito dele, porque desde que se reformou, nunca mais o vi nem tive notícias.

O Augusto soube agora que já faleceu. Foi um homem cheio de iniciativa e estava por dentro dos negócios que se faziam na Baixa. Os contrabandistas da minha terra (raia transcudana) conheciam-no todos, sobretudo os que negociavam com divisas estrangeiras. Em alturas de contenção na exportação de divisas, ele arranjava moeda estrangeira para os elementos do conselho de administração do Banco poderem deslocar-se ao estrangeiro sem os limites legais. A moeda estrangeira, adquirida nos bancos, para as deslocações ao estrangeiro, era registada no respectivo passaporte e não podia ultrapassar um limite pequeno. O Augusto era o socorro de todos os que queriam ultrapassar esse limite. Estava sempre pronto a ajudar os colegas ou amigos. Segundo diziam, ganhou bom dinheiro nesse negócio. O grande escritor da raia transcudana, Manuel Leal Freire, defende no seu livro «CONTRABANDO, DELITO MAS NÃO PECADO», estes homens lutadores pela vida. E eu penso que este contrabando não deve ser considerado grande pecado porque, na altura, todos recorremos a ele e nunca se ouviu dizer que algum destes contrabandistas tivesse sido processado.
Pois o Augusto, depois de o contencioso se ter mudado para a 5 de Outubro, ainda ficou algum tempo na Baixa, mas depois reformou-se e parece que estava bem de dinheiro. Mas talvez não tenha aguentado bem a mudança da reforma e não teve um fim muito feliz.
Não sei se foi ele que arranjou o whisky desta história que me contou um colega.
Num dos departamentos do Banco, os colegas compraram whisky, que na altura se chamava de Sacavém, ou seja de contrabando. Um dos colegas comprou uma garrafa de Martin's 20 anos, por um preço, claro, chorudo. Digo eu que se calhar o produto era o mesmo do das outras marcas, pois o vendedor (=engarrafador?) era o mesmo, mas enfim...
Então os colegas conseguiram, enquanto o comprador do Martin's foi almoçar, tirar com uma agulha e seringa, o whisky e meter-lhe na garrafa, chá em substituição.
Ele levou a garrafa para casa e os colegas todos os dias lhe perguntavam quando é que podiam ir a sua casa provar a pomada, desejosos de o confrontar com o chá que tinha comprado. Mas ele um dia acabou por dizer: olha pá, daquela pomada nenhum de vocês vai provar, porque já ofereci a garrafa ao médico da minha filha.
Choin...

1 comentário:

  1. Grande Augusto.
    Fui amigo dele durante muitos anos e fico com recordação da pessoa amável,prestável e fraterna, que sempre foi.
    Recordo com saudade os "desenrascanços" com ME e também o facto de o primeiro café de origem brasileira que bebi, ter sido comprado ao Augusto, que o fazia chegar a Portugal através dos seus "canais diplomáticos".

    Paz à sua alma.

    Joaquim Matos

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