quarta-feira, 10 de março de 2010

11 de MARÇO



No dia 11 de Março de 1975, eu trabalhava nos câmbios, no rés-do-chão da sede. Era Presidente da República o General Costa Gomes e Primeiro Ministro o Brigadeiro Vasco Gonçalves.


O General Spínola tinha sido afastado do poder e falava-se de que ele e a sua maioria silenciosa andavam a preparar um golpe. E, de facto, nesse dia, lá veio então o golpe. Foi um “drôle” de golpe, como diriam os franceses.

Guerra em directo na TV
Recordo as cenas de dois militares em directo na televisão, em frente ao RALIS, a discutir porque é que estavam a fazer o golpe e se não tinham recebido os panfletos, mas que panfletos, então e por uns panfletos vocês desatam aos tiros e não sei que mais.
Conclusão, à tarde, o Spínola e o seu grupo já estavam fugidos em Espanha. Diz-se que estavam refugiados na zona de Badajoz mas, em Vilar Formoso, ainda hoje se indica uma pensão, na estrada antes de chegar a Ciudad Rodrigo, onde terá dormido o Spínola, nesse dia. Sabe-se lá?
Mas o que interessa desse dia é que daí nasceu verdadeiramente o PREC, com a exigência de dar “um decisivo impulso à política antimonopolista e antilatifundista” que começou de imediato a ser proclamada através de manifestações e notas políticas.

No subsequente dia 13 constitui-se o Conselho da Revolução, que iniciou de imediato a nacionalização dos sectores básicos da economia:
Banca através do DL 132-A/75 de 14.
Seguros DL 135-A/75 de 15.03.
Em 16 de Abril, empresas petrolíferas(DL 205-A/75), Caminhos de Ferro Portugueses (DL 205-B/75), a Companhia Nacional de Navegação (DL 205-C/75), a Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos (DL 205-D/75), a TAP (DL 205-E/75), a Siderurgia Nacional (DL 205-F/75) e as empresas de energia eléctrica (DL 205-G/75).
Em 9 e 13 de Maio, cimenteiras (DL 221-A/75), de celulose (DL 221-B/75) e tabacos (DL 228-A/75).
Em 5 de Junho, Metropolitano de Lisboa (DL 280-A/75), a Empresa Geral de Transportes (DL 280-B/75) e 54 empresas de camionagem (DL 280-C/75).
Em 3 de Julho, Carris (DL 346/75).
A 14, 21, e 22 de Agosto, Pirites Alentejanas e Sociedade Mineira de Santiago (DL 434/75), a Companhia Nacional de Petroquímica (DL 453/75) e a Sociedade Portuguesa de Petroquímica, o Amoníaco Português e os Nitratos de Portugal (DL 457/75).
Em 1 e 25 de Setembro, Estaleiros Navais de Setúbal e os Estaleiros Navais de Viana do Castelo (DL 487/75) e a CUF (DL 532/75).
Em 2 de Outubro, (DL 561/75) Sociedade de Gestão e Financiamento e a Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes (do grupo CUF).
Em 2 de Dezembro, estações de rádio (DL 674-C/75) e a RTP (DL 674-D/75).
Em 17 de Dezembro,Sociedade de Fainas do Mar e Rio (DL 701-C/75), transportes fluviais do Tejo (DL 701-D/75) e a Sociedade de Cargas e Descargas Marítimas (DL 701-E/75). Em 20 de Julho, (DL 572/76) pesca.
Em 29 de Julho de 1976, (DL 639/76) jornais.

O Banco Nacional Ultramarino já tinha sido nacionalizado pelo Decreto-Lei nº. 451/74 de 13 de Setembro, que nacionalizou também o Banco de Portugal e o Banco de Angola, ou seja os bancos emissores.
Essa nacionalização não tinha representado qualquer significado em termos revolucionários, uma vez que estes bancos já eram maioritariamente do Estado.

Recordo-me de um dia, na cantina da cooperativa, no 1º andar da Rua da Prata, eu estar na mesa com o Sebastião Fagundes, o Narciso e o Tavares a falar no papel do BNU para a economia do sistema.
O Fagundes dizia que o nosso Banco era o sustentáculo dos empregos, e que estava a pagar a frota da TAP, a Ponte sobre o Tejo, compromissos que vinham de trás e que, com os meios do banco, não era difícil assegurar.

E quando já eu trabalhava no Secretariado Operacional, no final dos anos 70, tínhamos um dossier das responsabilidades relativas à reforma agrária que o BNU tinha financiado e que teve de esquecer e que perfazia milhões largos.
Bom…

Voltando ao 11 de Março.
O nosso banco já era do estado.
Mas houve quem, talvez querendo entrar na festa, arranjasse cartazes a substituir o nome para "BANCO DO POVO",que apareceram na fachada da sede e dalgumas agências de Lisboa, que eu vi. Não pegou. Alguns cartazes lá se aguentaram uns dias, mas não passou disso a tentativa.
Em todo o caso, o dia 11 de Março ficou indelevelmente ligado à nacionalização da banca portuguesa. Ainda eu estive pelo menos dois anos nos câmbios e nos balcões do rés-do-chão da sede eram colocados, nesse dia, vasos com flores comemorativas desse evento.

Actualmente, o 11 de Março é, a nível europeu e também nosso,
lembrado o ataque da Al-Qaeda na estação de comboios de Madrid, que ceifou imensas vidas inocentes.
Um minuto, uma hora, um dia, um ano, um século de silêncio não chegará para desagravar.

2 comentários:

  1. Excelente artigo. Um abraço
    Araujo

    ResponderEliminar
  2. Aqui está um artigo bem escrito, bem documentado e com isenção.
    Gente saiba escrever em português já vai sendo uma raridade.
    Obrigado e um abraço

    ResponderEliminar